O papel importante que a África tem na construção da identidade brasileira não é dúvida para mais ninguém. Mas a imagem que se tem do continente é limitada e repleta de velhos e resistentes estereótipos. É o lugar de onde emanam miséria, guerras étnicas, instabilidade política, Aids, fome, falência econômica, ou ainda natureza selvagem e ambientes exóticos. A escola exerce função importante no fortalecimento ou na desconstrução desse imaginário. Pesquisa realizada no Departamento de História da Universidade de Brasília (UnB) com base em livros didáticos mostra que o ensino da história do continente ainda está longe do ideal. O estudo faz parte da tese de doutorado A História da África nos Bancos Escolares: Angola, Brasil, Cabo Verde e Portugal.
Durante dois anos, o historiador Anderson Oliva analisou capítulos específicos sobre História da África anterior ao século 19 em manuais escolares destinados aos quatro últimos anos do ensino fundamental (5ª a 8ª séries). Das oito obras, quatro fazem parte da lista que o Ministério da Educação (MEC) indica para as escolas públicas e outros quatro são adotados por escolas privadas. Os principais problemas estão nas simplificações e generalizações que recaem em erros. Com isso, mantêm-se as falsas idéias e imagens sobre o continente e suas populações, além de reforçar a crença de que a África não possui relevância para a História da humanidade.
Um dos problemas mais comuns é a divisão do continente ao sul do Saara em apenas dois grandes conjuntos de povos. “Séculos de história e centenas de grupos étnicos são identificados apenas como os bantos e os sudaneses”, exemplifica. (figura 1) O único critério utilizado aí é o das línguas faladas na região em questão. Na realidade, de um grupo de línguas matrizes, inclusive a banto, surgiram outras centenas de línguas, mas que foram utilizadas por uma série de sociedades com diferenças profundas entre si. “É como se tratássemos toda a América Latina como uma sociedade igual”, compara o pesquisador. Uma alternativa a tal critério seria evidenciar as complexidades e diversidades da África Negra, como referências às centenas de grupos étnicos que podem ser encontrados ao longo dos séculos nos mais diferentes locais.
VISÃO EUROCÊNTRICA – De acordo com o levantamento realizado por Oliva, entre os livros analisados, o número de páginas destinadas à História da África é significativamente menor que o de outros assuntos. Enquanto os capítulos que tratam de temas como Europa Medieval, Absolutismo Monárquico, Renascimento Cultural e Construção do Pensamento Moderno Ocidental ocupam entre 15 e 20 páginas e vasta bibliografia, toda a história africana é, quase sempre, abordada em um único capítulo que varia de 10 a 15 páginas, e com uma literatura de apoio restrita. “Isso mostra que o ensino da disciplina ainda segue a visão eurocêntrica”, afirma.
Isso pode ser constatado na tentativa de utilizar padrões europeus para legitimar a importância da África. Segundo o historiador, encontrar grandes “impérios”, grandes construções e esplendorosas obras de arte se tornou quase uma obsessão. Porém, ressalta que, se a África é uma região de grande autonomia, capacidade criativa e de fecunda participação na História da humanidade, não seria preciso eleger padrões europeus para sua legitimação. É como se os “pequenos” grupos não tivessem relevância, ou diante da impossibilidade de atentar para os milhares de grupos que se espalham pela África, optou-se por se espelhar na História da Europa: o estudo das grandes civilizações ou reinos.
Apesar de todos os livros analisados serem novos – foram editados entre 1998 e 2000 –, há grande distância entre os conteúdos dos manuais e a recente produção historiográfica, o que demonstra continuidade dos olhares coloniais. Soma-se a isso o fato de o Brasil ter poucos cientistas que estudam a história, a arte ou a literatura daquele continente.
LEGISLAÇÃO – Mesmo depois da publicação da Lei 10.639/03, que tornou obrigatório o ensino da História da África e dos afro-brasileiros na educação básica, não foi implementada política específica para preparação de professores. “Nem todas as universidades oferecem disciplinas sobre o tema em cursos de graduação para os professores. E algumas das que oferecem, não o fazem dentro do currículo obrigatório, apenas como disciplina optativa”, afirma.
Em meio aos erros, algumas iniciativas acertadas dos autores merecem destaque. Muitos deles optaram por não utilizar imagens de negros escravos. Outros ainda chamam a atenção dos alunos para as representações feitas dos africanos pelos europeus: a mudança da fisionomia dos africanos, de seus gestos, roupas e comportamentos, que recebem feições européias. Ou ainda destacam aspectos dos padrões artísticos, sociais, políticos e as visões de mundo de algumas sociedades africanas, permitindo aos alunos criar uma intimidade maior com o continente.
De acordo com Oliva, editoras brasileiras têm se esforçado para fazer uma abordagem maior sobre o assunto. Já foram feitos livros paradidáticos, uma espécie de complemento aos livros que possuem falhas no tema. “É uma forma de preencher a lacuna de anos na educação, mas ainda não é o ideal”, reconhece Oliva, que dá suporte a um grupo de professores especializados que formam professores de educação fundamental em São Paulo. Juntos, eles fazem uma avaliação dos livros fundamentais e corrigir as distorções. A idéia é construir um novo material para os alunos com outra abordagem.
OUTROS PAÍSES – Com o avanço da pesquisa, Anderson Oliva avaliou também os livros didáticos de Portugal e Angola. Devido à guerra civil que só acabou em 2002, o país africano sofre com o déficit na educação, ainda que o governo venha se esforçando para recuperar tal lacuna. Há cinco coleções de livros didáticos que tratam da história da África de forma geral e dos povos africanos com profundidade.
Já em Portugal existem 30 coleções de livros de história para o mesmo período escolar. Porém, nenhum capítulo é dedicado à história africana por mais importante que tenha sido a relação histórica e econômica da ex-metrópole européia com esses países. Cerca de 800 mil africanos migraram para Portugal, que possui uma população de 10 milhões de pessoas. Eles freqüentam as escolas públicas e não encontram sua história nos livros. Normalmente apenas dois parágrafos citam a África e o fazem de forma preconceituosa sempre com o título A presença portuguesa na África Negra. “Os autores desses livros portugueses parecem considerar irrelevante a história de quase mil anos de um continente que manteve forte relação com o país europeu”, afirma o pesquisador.
CONTATO: Doutorando pela Unb Anderson Oliva pelo telefone (61) 3307 2754 ou pelo e-mail oliva@unb.br
sábado, 18 de agosto de 2007
A África que desconhecemos
A visão eurocêntrica, com relação a história do Continente Africano, ainda "reina" em nossa historiografia. Entendo que é preciso mudar este quadro e sabemos que educadores e outros profissionais, principalmente aqueles vinculados aos Movimentos de Consciência Negra, se esforçam para tanto. Estarei criando um espaço onde você amigo pode apresentar informações, textos, e estudos sobre o tema. Iniciamos com trabalho do Doutorando pela Unb Anderson Oliva.
sexta-feira, 17 de agosto de 2007
Palavras para uma apresentação
"É a tomada de consciência política – das populações primitivas –
que tornou nosso século (XX) o mais revolucionário da história".
Eric Hobsbawm
Educação e História. Minha formação como Bacharel em Administração de Empresas pela UFRural/RJ, serviu como os primeiros movimentos na busca de outros desafios. Atualmente, como Licenciando em História pela Universidade de Uberaba - verdadeira paixão, e Pós-Graduando em Docência do Ensino Superior pela Faculdades Integradas de Jacarepaguá, complemento os conhecimentos nas áreas de educação e história que sempre estiveram presentes como alicerces dos meus pensamentos e movimentos em projetos sociais.
Não desejo ficar nesta parte do caminho, muito pelo contrário, enquanto me for possível, continuarei a jornada. Aprendendo, ensinando, participando, estimulando outros para que também, após escolherem o caminho, não permaneçam inertes.
Este espaço será usado na publicação de alguns dos nossos trabalhos como discente e docente, servindo também, e desejando muito que ocorra, como espaço para receber textos e trabalhos relacionados a educação e história.
que tornou nosso século (XX) o mais revolucionário da história".
Eric Hobsbawm
Educação e História. Minha formação como Bacharel em Administração de Empresas pela UFRural/RJ, serviu como os primeiros movimentos na busca de outros desafios. Atualmente, como Licenciando em História pela Universidade de Uberaba - verdadeira paixão, e Pós-Graduando em Docência do Ensino Superior pela Faculdades Integradas de Jacarepaguá, complemento os conhecimentos nas áreas de educação e história que sempre estiveram presentes como alicerces dos meus pensamentos e movimentos em projetos sociais.
Não desejo ficar nesta parte do caminho, muito pelo contrário, enquanto me for possível, continuarei a jornada. Aprendendo, ensinando, participando, estimulando outros para que também, após escolherem o caminho, não permaneçam inertes.
Este espaço será usado na publicação de alguns dos nossos trabalhos como discente e docente, servindo também, e desejando muito que ocorra, como espaço para receber textos e trabalhos relacionados a educação e história.
Assinar:
Postagens (Atom)